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DA MENTIRA UM ENSAIO TRANSBORDANTE DE ERRORES
978-972-21-1859-0
altera o rosto, não lhe branqueia a imagem.
Obriga, sim, a um melhor «temperamento» do leque de instrumentos de que dispomos, a que se afinem e elaborem mais os dispositivos de um pensar crÃtico, que não abdica de procurar discernimento e orientação nos diferentes planos e nos meandros labirÃnticos da realidade. Convoca também — porque toda esta questão da mentira, sem excepções de condição nem prerrogativas de estatuto, nos interpela a todos de um modo descaradamente muito directo — uma firme mobilização exigente, e um vinculado empenhamento vigilante, da nossa tomada a cargo, ética e ontológica, da qualidade que vamos inscrevendo, com pensamentos e acções, no devir histórico das realidades.
Com a sageza crua de Machiavelli aprendemos — a partir das tristes experiências com a fogueira sofridas, entre muitos outros, por Girolamo Savonarola — que os profetas desarmados não triunfam, por maiores que sejam a generosidade da entrega, a nobreza dos desÃgnios e a razão que lhes assista. A literatura clandestina das Luzes setecentistas — respaldada em incontáveis exemplos, que a historiografia subsequente pode sem grande esforço multiplicar — acrescenta que a «velhacaria» (fourberie) sem as armas só raramente consegue os seus objectivos, pelo que não deixa de ser sensato precaver-nos contra as mentiras dos poderosos. Talvez seja, então, de não esquecer por completo um velho propósito de Marx, constante de um artigo de 1844, segundo o qual a teoria também se pode converter numa arma, também se pode tornar força material, desde que apropriadamente incarnada nos agentes susceptÃveis de operar a sua realização prática. Na realidade, e sem quaisquer acordes melancólicos de consolo compensatório ante as agruras dos tempos, a verdade — com criterioso trabalho procurada e com limpa veracidade transmitida, apesar, para além de, e contra todas as mentiras que intentam substituir-se-lhe, soterrá-la ou desfigurar-lhe o viso — constitui sempre um decisivo factor de emancipação humana. É disso, afinal, que se ocupam as revoluções cientÃficas — e as outras... também.